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Mito e Filosofia: Continuidade e Ruptura no Pensamento Humano

Um homem sentado no trono pensativo

Mito e Filosofia: Continuidade e Ruptura no Pensamento Humano

Introdução

A transição do mito para a filosofia representa um marco significativo na história do pensamento humano. 

Enquanto os mitos forneciam explicações simbólicas e narrativas para os fenômenos naturais e culturais, a filosofia surgiu como uma busca racional e sistemática por conhecimento. 

Joseph Campbell, em "O Poder do Mito", destaca que "os mitos são os sonhos públicos da humanidade". 

Por outro lado, Bertrand Russell, em "História da Filosofia Ocidental", observa que "a filosofia ocidental começa com os gregos e Sócrates é o pai da filosofia". 

Este artigo explora a continuidade e a ruptura entre mito e filosofia, destacando como esses modos de pensar influenciaram e moldaram a compreensão humana do mundo.

Desenvolvimento

Os mitos serviam como as primeiras tentativas das sociedades humanas de explicar o mundo ao seu redor. 

Mircea Eliade, em "O Sagrado e o Profano", argumenta que "os mitos são histórias sagradas que relatam como uma realidade foi criada e como ela funciona". 

Esses relatos simbólicos ofereciam uma estrutura para entender a natureza, a sociedade e o lugar do ser humano no cosmos.

Na Grécia Antiga, os mitos desempenharam um papel central na vida cultural e religiosa. 

Jean-Pierre Vernant, em "Mito e Pensamento entre os Gregos", explica que "os mitos gregos eram narrativas fundadoras que ajudavam a comunidade a compreender seu passado e suas tradições". 

Essas histórias de deuses, heróis e monstros refletiam as crenças e os valores da época, servindo como uma forma de educação e coesão social.

No entanto, com o surgimento dos primeiros filósofos, uma nova forma de pensar começou a emergir. 

Tales de Mileto, considerado o primeiro filósofo, procurou uma explicação racional para a origem do universo. 

Segundo Aristóteles, "Tales afirmou que a água é o princípio de todas as coisas". 

Essa busca por um elemento primordial e unificador marcou o início da transição do pensamento mítico para o filosófico.

Heráclito de Éfeso introduziu a ideia de que a mudança é a única constante no universo. Ele declarou que "não se pode entrar duas vezes no mesmo rio". 

Essa visão de um cosmos em fluxo perpétuo contrastava com a estabilidade e a permanência frequentemente encontradas nas narrativas míticas. 

Heráclito via o mundo como uma interação dinâmica de opostos, oferecendo uma nova perspectiva filosófica sobre a realidade.

Parmênides de Eleia, por outro lado, propôs que a mudança é uma ilusão e que a verdadeira realidade é imutável. 

Ele argumentou que "o ser é, e o não-ser não é". Essa ênfase na imutabilidade e na unidade do ser representava uma ruptura significativa com a visão de um mundo em constante transformação, destacando a tensão entre mito e filosofia.

Pitágoras de Samos trouxe uma perspectiva matemática ao pensamento filosófico, sugerindo que "tudo é número". 

Ele acreditava que os princípios matemáticos subjazem à estrutura do universo, uma ideia que refletia uma continuidade com a harmonia e a ordem encontradas nos mitos, mas também uma ruptura ao buscar explicações racionais e abstratas.

Sócrates, frequentemente considerado o pai da filosofia ocidental, utilizava o método dialético para explorar questões éticas e epistemológicas. 

Platão, seu discípulo, registrou muitos de seus diálogos, onde Sócrates afirmava que "uma vida não examinada não vale a pena ser vivida". 

Esse foco na auto-reflexão e na busca pela verdade representava uma ruptura clara com as explicações míticas, promovendo uma forma de pensar crítica e racional.

Platão desenvolveu uma filosofia abrangente que incluía a teoria das formas, onde ele sugeria que o mundo sensível é apenas uma sombra da verdadeira realidade. 

Em sua obra "A República", ele descreve a alegoria da caverna, destacando que a maioria das pessoas vive em uma ilusão, ignorantes da verdadeira realidade. 

Platão acreditava que "o conhecimento verdadeiro só pode ser alcançado através da razão", marcando uma ruptura com as explicações míticas baseadas nos sentidos e na tradição.

Aristóteles, discípulo de Platão, divergiu de seu mestre em vários aspectos. 

Ele enfatizou a observação empírica e a lógica como fundamentos do conhecimento. 

Segundo Aristóteles, "o conhecimento começa pelos sentidos, mas só é completo pela razão". 

Ele desenvolveu um sistema filosófico abrangente que influenciou inúmeras disciplinas, da biologia à ética, promovendo uma ruptura com o pensamento mítico ao buscar explicações baseadas na observação e na lógica.

Apesar dessas rupturas, a filosofia grega manteve elementos de continuidade com os mitos. 

Por exemplo, Platão e Aristóteles frequentemente utilizavam mitos e alegorias para ilustrar suas teorias filosóficas. 

Isso sugere que, embora a filosofia tenha buscado explicações racionais, ela não abandonou completamente o valor simbólico e narrativo dos mitos.

Os sofistas, como Protágoras, trouxeram uma abordagem relativista à verdade, afirmando que "o homem é a medida de todas as coisas". 

Esta perspectiva desafiou tanto os mitos quanto a filosofia tradicional, promovendo uma ruptura ao sugerir que a verdade é relativa e dependente das percepções humanas. 

Isso abriu espaço para discussões mais amplas sobre ética, política e retórica.

A filosofia helenística, com escolas como o estoicismo, o epicurismo e o ceticismo, continuou a expandir e diversificar o pensamento filosófico. 

Zenão de Cítio, fundador do estoicismo, ensinava que "viver conforme a natureza" é o caminho para a virtude e a felicidade. 

Essa escola destacou a importância da razão, do auto-controle e da aceitação do destino, mostrando uma continuidade com a busca filosófica por explicações racionais.

O epicurismo, fundado por Epicuro, propôs que "o prazer é o início e o fim de uma vida feliz". 

No entanto, Epicuro diferenciava entre prazeres físicos e prazeres do espírito, enfatizando a importância da ataraxia (tranquilidade) e da ausência de dor como o verdadeiro objetivo da vida. 

Isso representava uma continuidade com as buscas filosóficas por uma vida boa e uma ruptura com os valores míticos tradicionais.

Conclusão

A transição do mito para a filosofia na Grécia Antiga representa tanto uma continuidade quanto uma ruptura no pensamento humano. 

Enquanto os mitos ofereciam explicações simbólicas e narrativas para os fenômenos naturais e culturais, a filosofia surgiu como uma busca racional e sistemática por conhecimento. 

Através das contribuições de pensadores como Tales, Heráclito, Parmênides, Sócrates, Platão e Aristóteles, a filosofia evoluiu para um campo abrangente e diversificado, cujo impacto continua a ressoar na sociedade contemporânea.

Referências

  • Campbell, J. "O Poder do Mito"
  • Eliade, M. "O Sagrado e o Profano"
  • Vernant, J.P. "Mito e Pensamento entre os Gregos"
  • Russell, B. "História da Filosofia Ocidental"
  • Aristóteles, "Metafísica"
  • Platão, "A República"
  • Sócrates, "Diálogos" (registrados por Platão)
  • Pitágoras, "Fragmentos" (como mencionado em fontes secundárias)
  • Heráclito, "Fragmentos"
  • Parmênides, "Sobre a Natureza"
  • Protágoras, "Fragmentos"
  • Zenão de Cítio, "Fragmentos"
  • Epicuro, "Cartas e Máximas Principais"

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